Anoitecia cedo, e eu sufocava de tristeza e nostalgia. Ainda não tinha tempo de fazer amizades, os meus trabalhos de laboratório estavam indecisos, e em vão tentava interessar-me pela gente com quem, ocasionalmente, entrava em contacto. Saía de manhã, ainda sem sol, e reentrava ao prematuro entardecer. Tinha levado anos a sonhar com a independência, que nem usufruíra a meu gosto, e agora, senhor de mim, sentia-me de repente incapaz de usar dela. O “estrangeiro” desiludia-me aos primeiros contactos, e eu retraía-me. A verdade, não tardaria em sabê-lo, é que a liberdade pessoal e o sossego se pagam em solidão, tributo o mais pesado. Por contraditório que pareça, só a presença de outros seres humanos acorda em nós as reacções que nos forçam a pensar, a mobilizar os conhecimentos, e a agir. Isto explica como é que eu nunca consegui viver sozinho nem longe — duas coisas que desejava ardentemente. E também porque nunca fui feliz na companhia de ninguém, nem tornei felizes senão aqueles que, de mim, só conhecem as aparências. Mas esta dialéctica da misantropia (ou timidez) não será demasiado especiosa para ti, Léah?
[José Rodrigues Miguéis]
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