Tinhas
partido e era eu que ficava em casa, à tua espera. Como Penélope, era eu
que te esperava, que mantinha a esperança. Contra o mais elementar
senso comum.
Mas um dia, ao contrário dela, deixei de esperar. Percebi que não
voltarias, que ninguém volta, que o regresso não é possível: nunca
ninguém se banha duas vezes na mesma água de um rio.
Percebi que a minha fidelidade era louca, que a vida me passava ao
lado. O universo estava em movimento e também eu comecei a mover-me.
Percebi que, se voltasses, eu ficaria sentado à tua frente em
silêncio e não poderia comunicar contigo: haveria entre nós a barreira
do tempo.
Porque não é possível alguém voltar ao leito conjugal e fazer amor,
contar o que sucedeu durante os anos de ausência, enquanto uma deusa faz
com que a noite se prolongue e o dia tarde a nascer para termos tempo
de contar o tempo intermédio e tudo voltar a ser como era, desde o
momento em que foi interrompido.
Nada disso era possível, a não ser numa história mal contada.
Tínhamos saído da vida um do outro, cada um tinha agora a sua.
Então assumi que não irias voltar.
Um dia acordei com essa certeza: nunca irias voltar.
E Lisboa desapareceu contigo.
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