domingo, 16 de julho de 2017

A longitude de um coração em delírio


Regresso devagar ao teu 
sorriso como quem volta a casa. Faço de conta que 
não é nada comigo. Distraído percorro 
o caminho familiar da saudade, 
pequeninas coisas me prendem, 
uma tarde num café, um livro. Devagar 
te amo e às vezes depressa, 
meu amor, e às vezes faço coisas que não devo, 
regresso devagar a tua casa, 
compro um livro, entro no 
amor como em casa. 


[Manuel António Pina]

I don't do too much talking these days


carmen-garcia:
“ Revelado manual B&N
(9/6/2014)
ph:Carmen García
”
[Nico]



Quando a perda nos alivia mais do que fere;


no meio da confusão alguém partiu sem se despedir. foi triste. se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece num baile de carnaval — uma pessoa perde-se da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. é melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito — depois apenas aconteceu que não se encontraram mais. eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado — sem glória nem humilhação.
creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.

[rubem braga]

terça-feira, 4 de julho de 2017

Eis o derradeiro sinal:


Vou esvaziando os copos
e começo a compilar beijos,
como quem junta, à pressa, moedas caídas pelo chão:
somos todas putas, rapaz,
com ou sem vodka.

[Golgona Anghel]