sexta-feira, 26 de abril de 2024

A faca corta o fogo


Vive

Aquel amor
aquel
que tomé con la punta de los dedos
que dejé que olvidé
aquel amor
ahora
en unas líneas que
se caen de un cajón
está ahí
sigue estando
sigue diciéndome
está doliendo
está
todavía
sangrando.
[Idea Vilariño]

quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Eros ou onde estragar a cara


Pois morre-se de muita coisa, de muita coisa
se morre, morre-se por tudo e por nada
morre-se sempre muito
Por exemplo, de frio e desalento
um pouco todos os dias
mas de calor também se morre
e de esperança outro tanto
e é assim: como a esperança nunca morre
morre a gente de ter que a esperar
Morre-se enfim de tudo um pouco
De olhar as nuvens no céu a passar
ou os pássaros a voar, não há mais remédio
ó amigos, tem que se morrer
Até a respirar se morre e tanto
tão mais ainda que de cancro
De amar bem ou amar mal
de amar ou não amar, morre-se
De abrir e fechar, a janela ou os olhos
tão simples afinal, morre-se
Também de concluir o poema
este ou qualquer outro, tanto faz
ou de o deixar a meio, o resultado
é o mesmo: morre-se
Data-se e assina-se- ou nem isso
Sobrevive-se- ou nem tanto
Morre-se- sempre
Muito

[Rui Caeiro]