domingo, 18 de maio de 2014

O ritmo de plástico


Nesse rio,

quedou perplexa: tinham chegado mais algumas palavras. O bico do pássaro não pára de bater.
      Ouviu então a voz      terrível,      sustentada pela nova melodia tocada pelas folhas:
      "mas a própria unidade do amor a que afectivamente aspiras não te ama porque se fragmenta." Pausa. "O que respondes ao que tu lhe pediste, e ele não deu?!"
      A pergunta foi tão certeira que a mulher sentiu-se cair, e ficou numa espécie de delírio. O urso escondeu o piano, lançando-se a comer toda a folhagem da cúpula. Decidira brincar com problemas sentimentais.
      - Mas é preciso escutar a parte séria da minha brincadeira - disse a Parasceve.
      Eu tinha anotado, na minha agenda, um encontro no sábado com um urso-de-colar que muito estimava, e que fora adiado para a próxima quinta-feira. Esqueci-me de recomendar-lhe que, entretanto, me mandasse uma mensagem para o exercício do som e das palavras. Postal que não vai certamente lembrar-se de mandar-me.
      - Eu sei que as regras do amor têm ritmo - imaginei que respondia Parasceve. - E não são cenas infantis - retorquiu-lhe, limpando com a língua uma lágrima que lhe deslizava pela face: - Seria um deserto se ninguém conhecesse esse ritmo.
      Sim, seria. Mas o amor é fraco, e logo vacila.
 
[Maria Gabriela Llansol]

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